À conversa com… Aurora Mesquita

Aurora Mesquita nasceu e cresceu em Alijó, mas grande parte da sua vida foi passada em Angola. Mais tarde regressa para desempenhar funções administrativas no antigo hospital da Misericórdia. Recorda hoje com saudade esses tempos.

A D. Aurora nasceu, cresceu e fez muito da sua vida em Alijó. Quando foi para Angola, em 1951, como mantinha a ligação à sua terra natal?

A ligação que eu mantinha com a minha família era através das cartas, mas o que se tornava difícil era o facto de enviar uma carta e ela só ser entregue passados uns meses. Demorávamos a ter notícias da família

Como era a sua vida em Angola e, mais concretamente, nos serviços dos CTT onde trabalhava?

Tinha 33 anos quando decidi tirar o curso de dactilografia, a escola dos CTT estava aberta naquela altura. Entrava às 7h e saía às 11h, o curso durou 11 meses. Ao fim deste período fiquei com o curso de Auxiliar de Administração, mais tarde andei mais 11 meses a tirar o curso de Operador de Radiotelegrafista, pois o vencimento era melhor. E foi esse curso que me deu equivalência ao 5.º ano, caso contrário não podia ir trabalhar para os correios. Mais tarde, estava como Auxiliar de Administração e fiquei a trabalhar numa estação que era mais perto de casa. Passados uns tempos o meu marido ficou doente. Fomos a um médico que nos mandou vir para Portugal para fazer o tratamento, viemos em agosto e ele faleceu em maio do ano seguinte. Os meus filhos ficaram em Angola com uma irmã minha durante este período. Depois disto, regressei para Luanda. Tinha dois filhos para cuidar, o mais velho ia para a Universidade e a mais nova estava a terminar o secundário. Depois do meu marido falecer ainda estive lá 4 anos com os meus filhos e consegui voltar a trabalhar nos correios, que eu pensava ter perdido o lugar quando vim para Portugal devido ao estado de saúde do meu marido.

De que forma sentiu o seu regresso a Portugal depois do 25 de Abril?

Naquela altura tinha vindo de Angola e trabalhava lá nos CTT, quando vim para cá não existia a especialidade de Operador de Radiotelegrafista, pois vim integrada no Quadro Geral de Adidos e nessa altura os CTT tinham sido privatizados . O diretor perguntou-me se eu queria ser transferida para Alijó para lugar de Escriturária e eu aceitei. Mesmo não sendo o curso que eu tinha feito eu precisava de ganhar dinheiro, pois queria ajudar os meus filhos.

Como surgiu a oportunidade de ir trabalhar para o Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Alijó?

Fui trabalhar para o atendimento ao público do antigo Hospital, não estive muito tempo com estas funções. Acharam que poderia ser mais útil noutro lugar, fiquei a tratar da parte administrativa. Depois tornei-me Irmã da SCMA e fiquei como voluntária a ajudar no que era necessário.

Naquele tempo, o Hospital era a instituição de saúde mais importante do concelho. Qual O papel que essa infraestrutura tinha para as pessoas? A D. Aurora contactou de muito perto com as Irmãs Vicentinas, Como é que vivenciou esse período da sua vida?

Naquela altura, as freiras ajudaram muito. Residiam lá no Hospital, algumas delas eram enfermeiras e prestaram um grande apoio às pessoas do concelho. Os meus netos nasceram naquele hospital e a minha mãe faleceu lá, elas tratavam sempre bem todos os utentes e mereciam o nosso maior respeito. O Hospital pertencia ao Estado, a SCMA naquela altura tinha o Lar e eu convivi com as freiras, sempre as tratei com carinho porque mereciam.

Do serviço dedicado à Misericórdia que memórias guarda dos Provedores com quem teve oportunidade de trabalhar?

Recordo-me do Senhor Jerónimo, era um homem muito trabalhador. Sempre vi as pessoas a ficarem depois da hora a fazer o serviço e como eu via aquele trabalho, sendo Irmã, senti-me na obrigação de também prestar o meu apoio. Fiquei com as rendas das casas, recebia o dinheiro das pessoas e eu depois entregava o dinheiro à contabilidade. Recordo-me de ter sido convidada por ele para ir à inauguração da ampliação do Lar, em 2001.

Durante o tempo que esteve a trabalhar na Santa Casa como é que a Instituição era vista no concelho?

Na altura toda a gente ajudava a SCMA, eram realizados cortejos de oferendas e todos ajudavam no que podiam. Vinham os carros dos bois carregados de alimentos, todos davam o que podiam. As pessoas ficavam muito orgulhosas com o Hospital, era visto como uma coisa muito importante para o concelho!

A Santa Casa comemora 120 anos de um serviço de proximidade à comunidade. É uma casa feita de pessoas e para as pessoas. Como antiga funcionária e com uma forte ligação sentimental gostaria de deixar uma mensagem para todos quantos lá trabalham?

Eu acho que infelizmente as pessoas precisam de emprego e a SCMA é uma relíquia que as pessoas têm aqui! Devem respeitar, trabalhar e zelar pelos interesses da Casa, tal como eu fazia. Quem trabalha merece todo o respeito. A mensagem que quero deixar aos funcionários é que sejam fiéis com a Casa, que exista lealdade para com a Instituição e entre os funcionários. Devem respeitar os utentes da SCMA e dar o seu melhor para cuidar deles!

Por Joana Vieira e M.ª Bárbara Granja

Santa Casa da Misericórdia de Alijó, como tudo começou!

O historiador Joaquim Barreira Gonçalves partiu à descoberta das origens da Instituição, desde a criação da unidade hospitalar até à aprovação dos seus Estatutos.

Em 28 de dezembro de 1899, com o País a sofrer um forte surto de peste bubónica, é implementada a organização geral dos Serviços de Saúde Pública, reforma sanitária de Ricardo Jorge, sob o Governo de José Luciano de Castro, e o Regulamento Geral dos Serviços e Beneficência Pública, logo depois, em 24 de dezembro 1901, sob o Governo de Hintze Ribeiro.

Nessa época, no Concelho de Alijó, não existia qualquer estabelecimento hospitalar, ou semelhante, para atendimento e tratamento de doentes. É, nessa altura, 1901, que a sociedade civil de Alijó arrebita a sua resiliência, com a cooperação de alijoenses ilustres, como o senhor Alexandre Gonçalves, de Vale de Cunho, e aí falecido em 2 de março de 1897, por testamento, de 1 de março de 1897, legou parte dos seus bens “…para o primeiro hospital ou casa de misericórdia que se formar na cabeça da comarca ou concelho…”, seguido pelas senhoras D. Amélia Bravo Borges e D. Delfina Borges Ervedosa, que fazem a doação da casa que possuem na vila, para ali se estabelecer um hospital e para qual fim houve a primeira reunião, em 19 de Março de 1901.

Na escritura de doação da casa, refere ter esta, pelo lado do poente, uma passagem de águas de rega, pelo quintal dos herdeiros de Luís Flamino Teixeira de Azevedo, sendo uma hora de água de 15 em 15 dias, contada da 1 às 2 horas da tarde de quinta-feira. “

No dia 2 de maio de 1901, João Dias Mateus, Juiz de Direito e Governador Civil de Vila Real, aprovou os Estatutos pelos quais se havia de reger o Hospital que pretendiam instituir na Vila de Alijó sob a invocação de Frei João Pecador. Ficava assim oficializado o Hospital de Alijó; Em 5 de dezembro de 1907, concedeu a Câmara Municipal de Alijó, devidamente autorizada, 1 000 litros de água em cada 24 horas, para o hospital. Foi captada na canalização municipal, na caixa d`ar da Gricha do Meio;              

Em novembro de 1909, mediante determinadas condições, deliberou a Junta de Paróquia de Alijó ceder a esta Misericórdia, para lhe servir de templo, a capela do Senhor do Andor. Logo, nesta data, já existia a intenção de criar a instituição Santa Casa da Misericórdia de Alijó e já assim apreciada.

Aos 12 de junho de 1912 reúnem-se em Assembleia-geral “os antigos sócios do Hospital de Todos os Santos, que ficam sendo Irmãos Fundadores, e pelas pessoas que forem admitidas como Irmãos, nos termos destes estatutos.”     

No artigo 5.º dos referidos estatutos regista: “A instituição denominada Hospital de Alijó ou de Todos os Santos, criada pelos Estatutos aprovados por Alvará de 2 de maio de 1901, fica, substituída, para todos os efeitos, por esta Irmandade, para qual passam, integralmente, os haveres e encargos daquele Hospital.”  Estava, desta forma, institucionalizada a Santa Casa da Misericórdia de Alijó, em 12 de junho de 1912.

Havia, porém, ainda algum caminho a percorrer, pois não podemos esquecer que a República liderava o Estado há cerca de dois anos, o que levou serem analisadas, detalhadamente, todas as instituições e coletividades, em especial as relacionadas com a Igreja. Em 28 de Janeiro de 1913 a Santa Casa da Misericórdia de Alijó submete à aprovação a reforma dos seus estatutos, a fim de dar cumprimento ao disposto no art. 169.º do Decreto, de 20 de abril de 1911.                                                       

“Considerando que a referida reforma os harmonizou com o consignado no aludido decreto e mais legislação aplicável;

Considerando porém que o consignado no art. 13.º, parágrafos 2.º e 3.º , fazendo depender o funcionamento da assembleia-geral da presença da maioria dos irmãos residentes na freguesia de Alijó, estabelece uma diferença entre os restantes irmãos que não pode justificar-se;     

Considerando que o disposto no parágrafo único do art.º 15.º, determinando que a venda de papéis de crédito só pode ser deliberada com a maioria dos irmãos residentes no concelho de Alijó, estabelece um princípio que não pode aceitar-se, porquanto, ainda estando presente a maioria dos irmãos a assembleia não poderia funcionar não assistindo a maioria dos residentes no concelho de Alijó, podendo, portanto, ficar uma minoria a obstar a resoluções de importância;

Considerando que as palavras do art. 35.º “ou ações de bancos e companhias de reconhecido crédito e prosperidade” se não harmonizam com o disposto no art. 35.º do Código Civil, que somente permite às associações ou corporações perpétuas empregar fundos consolidados do Estado os capitais que se destinam a fundo;             Usando da faculdade que a lei me confere:

Tenho por conveniente aprovar os presentes estatutos da Santa Casa da Misericórdia da vila de Alijó, com as seguintes alterações: Ficam eliminadas: as palavras “pelo menos e residentes nesta freguesia” do paragrafo 2.º do art. 13; as palavras “residentes nesta freguesia” do paragrafo 3.º do mesmo artigo; as palavras “ou ações de bancos ou companhias de reconhecido crédito e prosperidade” do art. 35.º. Por firmeza do referido mandei passar o presente alvará, que assino e vai selado com o selo branco que serve neste Governo Civil.                                                                 

Vila Real, 28 de janeiro de 1913.                             

José de Carvalho Araújo Júnior.”

Joaquim C. Barreira Gonçalves, Investigador de história local

 

Fotobiografia dos 120 anos da Santa Casa da Misericórdia de Alijó

Antigo Hospital Maternidade de Alijó, fundado a 11 d novembro de 1941.O mesmo edifício acolhe hoje a UCCI de Alijó.

 

 Edifício do primeiro hospital da vila de Alijó. Inaugurado em 1 de novembro de 1901.

 

Fundada em 1931, a Creche da SCMA funcionou no atual edifício dos Serviços Administrativos. Em 2 de julho de 1994 era inaugurado o novo e atual espaço que contou com a bênção Bispo da Diocese de Vila Real, D. Joaquim Gonçalves. 

Inaugurada em 1985, a ERPI da SCMA viu ampliadas as suas instalações, cuja inauguração acontece em novembro de 2001. Nesse evento histórico, de entre as várias personalidades que marcaram presença, destaca-se a de Maria Barroso, então Presidente da Cruz Vermelha. 
Muitas foram as personalidades que ao longo dos anos dedicaram o seu tempo na defesa dos valores da SCMA. 120 anos depois, a Instituição trabalha arduamente para honrar o legado e continuar a construir um futuro mais próspero para esta Instituição centenária. 
O antes e o depois da Farmácia da SCMA. Corria o ano de 2011 quando o espaço foi alvo de uma grande intervenção com vista à sua modernização. 

Em 8 de setembro de 2010 era inaugurado o Centro Social do Pinhão. A cerimónia contou com a presença da Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, Dr.ª Helena André.

A Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Alijó abriu portas em 1 de novembro de 2008. Na cerimónia de inauguração marcaram presença o Primeiro-Ministro, Eng.º José Sócrates, a Ministra da Saúde, Ana Jorge e o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Pedro Marques.